sábado, março 03, 2007

Aprendi com a minha mãe


Estou lendo um livro chamado “Aprendi com a minha mãe” . Já de saída a autora deixa claro que este titulo é apenas para evocar Outro(Aprendi com meu pai) .
Com mãe as coisas são diferentes.Nunca temos apenas uma lição ou uma frase de efeito para lembrar, e sim todo uma postura, uma historia, uma evocação.
Alguma histórias são maravilhosas.Como a da mãe da Cleide Yacónis que morava em um container, passava fome com as três filhas .Ser mãe solteira há 70 anos atrás não era fácil.Nem hoje.
Quando as coisas estavam muito difíceis, ela “improvisava um teatro” colocando papel celofone na única lâmpada da casa.Cacilda Becker, que eu não sabia ser irmã de Cleide Yacónis, cantava e dançava e elas esqueciam as dificuldades.Elas não tinham cobertor, então a mãe as agasalhava com o corpo nas noites de frio: uma filha no braço direito,uma no braço esquerdo outra no meio das pernas.
A história de Constança Pasolato é diferente: a mãe era fria e aristocrática, uma relação dificil ,de desconfiança e descrédito.
Acho que o Eduardo Suplicy não entendeu a idéia do livro, fala mais sobre política do que sobre a mãe.
A Giovanna Antonelli narra uma historia absolutamente comovente sobre como sua mãe mantinha viva a lenda de papai Noel pendurando algodão nas grades do apartamento para dizer que as barbas do papai Noel ficaram presas !Ela fazia questão de criar criar as filhas em um mundo onde houvesse alguma magia para acreditar.

É difícil ler um livro desses sem refletir sobre meu papel de mãe e de filha.Fico pensando em como meus filhos me verão, se haverá historias ternas para contar.
Enquanto filha, tenho pensado muito em minha mãe.Nossa relação nunca foi muito boa, acho que me aborreci mais do que devia.Tenho pensado que exijo demais dela.Nem sempre ela acertou, nem sempre errou, mas continua tentando.Fez o melhor que podia dentro de suas capacidades e a intransigência que tanto me irrita foi apenas um dos meios para conseguir ir levando.Sua vida não foi fácil e ainda não é. Às vezes cisma comigo .E daí que eu afirme estar absolutamente bem?Não estou do jeito que ela quer, então não estou bem e pronto.
Ela não concorda com minha idéia de felicidade, nem eu com a dela.
Estou pensando em alguma história, algum fato pitoresco pra contar sobre nós duas, alguma lição aprendida, mas nada me vem.Lembro que sentia raiva dela quando acontecia alguma coisa que eu considerava grave e ela ria dizendo que era besteira.Lembro de jurar que nunca faria isso com meus filhos, mas às vezes faço.
Não gostava quando ela me fazia encarar as coisas que tinha medo.Advinha...Às vezes eu também faço isso!Quando vou ver, já fiz!
Eu gostava de ficar abraçada com ela na cama depois do almoço.Não faço isso com minha filha por que ela odeia.
Não imponho minha religião a minha filha.Nisso somos diferentes.Até hoje este é o ponto de maior divergência entre eu e minha mãe.
Mas lembro-me de um momento que ela já esqueceu,quando aos 14 anos cheguei do curso de inglês com a calça manchada de sangue.
Senti-me humilhada, envergonhada...Queria nunca mais ver aquelas pessoas que ficaram rindo de mim.
Ela  me ouviu, contou casos semelhantes que aconteceram com outras mulheres.Hoje acho que a história que ela contou, que havia acontecido com minha tia no dia do noivado era pura invenção.Mas na hora foi confortante.
Gosto de imaginar que ela me deixou no quarto, dizendo que ia colocar minhas roupas de molho e depois voltou com um chá de camomila e bolinhos de chuva e que um sentimento terno nos envolveu, mas ela não era disso...Talvez nem eu naquela época.

Depois, foi o correr da vida.Todas as preocupações e problemas que ela inventou e que eu verdadeiramente criei.Quase nunca lhe servi de apoio ou de conforto.Estava sempre alerta, pois a qualquer momento, qualquer sentimento que eu demonstrasse poderia ser alvo de críticas.
Hoje vejo seu rosto cansado e gostaria de voltar no tempo,com mais experiência para mudar muita coisa entre nós.